sexta-feira, 29 de novembro de 2013

NÃO! HÁ OBRA! ou TAMARINEIRA

Dedicado ao Doida de Pedra - projeto que está sendo desenvolvido em Recife/PE dentro do Hospital Psiquiátrico Ulysses Pernambucano (HUP)


Apenas loucos - chamava
Em vão - gritava
Clausuras na mente
Oh! Alienista doente!

De Hipócrates a hipócritas
Julgo de fantasias, lirismos
Anormais serventias
Tudo vão
Retiraram as estrelas
Deram-me o chão

Maria de França e Checov me acompanham
Aposentos e celas
Cavalos alados flutuam
em romances, novelas

Não há mais choques
Seria chique
A  não castrada dor
Ecoa ainda
Versos de Artaud

No eterno teatro da crueldade
Sou cavaleiro Quixote
Da maldade - combatente
Náufrago de uma nau errante
Um voz gritante - calada
Silenciada pela tortura
Sou mais Tamarineira
Sou mais Loucura

"Eu... aprendendo a ser louco"

domingo, 24 de novembro de 2013

ENTREVERDADES ou VOLTEI A CONTAR



Ele entrou no banheiro. Não sabia direito o que estava acontecendo com sua mente e seus sentimentos. Estava apenas tomado por uma sensação que não compreendia muito bem. Era uma mistura de angústia, dor, medo, pavor, insegurança, angustiosidade, sem sequer saber se esta palavra existia. Se não, paciência. Viraria neologismo.
Ele estava com angustiosidade.
Olhou no espelho e tossiu uma tosse seca. O estômago começava a embrulhar. As dores tornavam-se cada vez mais frequentes. 

O que era isso? Meu deus, será que o fim está próximo? - como sempre, temeu.

Passou as mãos pelo rosto. Sentiu vontade de chorar. Puxou os cabelos. Subitamente desejou incontrolavemente de extirpar-se de todos os seus pelos. Pegou uma máquina e quis se raspar por completo. Começou pela sobrancelha. Ao ver que uma já não mais existia sorriu um sorriso desesperado, admirado com o que tinha feito. Viu-se horrível e imaginou o que os amigos diriam quando o visse. “Que porra é essa, cara?”. Eles o tomariam como louco. Talvez fosse o melhor, assim eles compreenderiam que algo não estava nada bem com ele. Quem sabe o ajudariam. Não. Isso é impossível.
Ele já andava confuso há milênios.

Meus deus, preciso de um cigarro. Onde estão meus cigarros? – disse a si mesmo.

Mais tosse, desespero e enfim um vômito de vazia barriga sujando toda a pia e o espelho. O gosto amargo toma conta de sua garganta e sua boca. Seu nariz sujo de vômito o incomoda. O cheiro nem tanto.
Bochecha uma água qualquer, o gosto amargo ainda se faz presente. Assua o nariz e olha o seu rosto. Estava sem uma sobrancelha. Estava horrível. Sorrio mais uma vez em desespero, transparecendo o que sentia por dentro.
Caminhou até a cozinha e pegou uma garrafa de whisky já meio vazia. Colocou em sua boca e engoliu de uma só vez. Seu estômago queimava por completo.

Nada está em ordem.

Viu-se perdido em universos sem sentido. O que o levou até ali?

Tomou conta da narrativa. Ele explicaria melhor.

Perco-me em lembranças que desconheço. Seria o passado ou o futuro? Estou inseguro. Medo, medo, medo e mais medo. Sou um garotinho assustado.
Nada tem sentido.
Seria o amor? O ciúme? Os demônios?
Confesso meus pecados ao jovem Werther. Ele me aconselha uma única bala no peito. Seria lindo. Não precisaria me preocupar. Faria uma carta e diria que morri por amor e culparia Werther como autor intelectual. Nesse momento Hamlet me censura e manda-me refletir.
Choro. Um choro preso na garganta desde a infância. As lágrimas teimam em não cair. Ficam presas. Deixam apenas meus olhos brilhando. Sinto o ardor. Sinto o nariz doer. Não sei chorar.

Grito.

Estou enlouquecendo, meu deus.

Um estilete. Hamlet sempre falou da quietude de um simples estilete. Afinal, estilete eu tenho, revólver não. Werther, esse suicídio você perdeu, ele é de Hamlet.

Meu deus, não. Não posso me matar.

Seria encontrado sem sobrancelha. Tomar-me-iam como louco e suicida. E todos que gostam de mim, como ficariam? Não! Não posso fazer isso. Preciso apenas de um pouquinho de drogas. Um baseado, talvez. Meu corpo ficaria mais lento e minha mente mais calma.

Senhor, e se eu voltasse para a igreja?

Se eu dissesse a Jesus – Pai, me perdoa.

Aprenderia a chorar. Eu choraria muito e Ele compreenderia tudo que está em minha alma, meus tormentos. Afinal, Ele sempre sabe de tudo. E não sou um mal sujeito.

Pronto!

Está tudo resolvido.

Um banho!
Preciso de um banho. Tudo fica melhor depois de um banho.

Band-aid. Um band-aid, por favor.

Saio à rua.

De bate-pronto encontro um conhecido.

Que porra é essa na tua cara, velho?

Sorrio e respondo:

Nem te conto. Fiz uma aposta idiota e perdi minha sobrancelha numa partida de sinuca. Leseira do caralho, não é?

Apenas rimos.

Tudo está bem.

"Não foi nada. Eu não fiz nada disso...Bicho de sete cabeças"